
Seus pés já estavam cansados de tanto andar. Seus braços pareciam soltar dos ombros. Chovia e ele tentava esquecer do frio que sentia. A cada cinco minutos olhava para o bebê, via se ainda respirava. Parou perto de um restaurante elegante. Havia muitas luzes por lá e isso fazia as paredes do prédio ficarem um pouco mais quentes do que era comum num dia frio como aquele. Ele se encolheu para que ninguém visse a criança que dormia tão serenamente em seus braços, tinha medo de perdê-la. A fome já corroia seu estomago e ele arquitetava um plano para conseguir alguma comida.
Do outro lado da rua havia uma mulher parada. Alta, magra, loira, com o rosto cansado. Ela esperava. E enquanto esperava, pensava. Passara a vida inteira questionando coisas, esse era seu trabalho, e mesmo quando queria parar não podia. Seu cérebro já tinha se acostumado a questionar. E quando isso acontece é como uma praga que não nos deixa relaxar. Isso nos faz realistas ao extremo, engole nossos sonhos. Seus olhos sempre percorriam as coisas em busca de uma interrogação. Uma perguntinha qualquer. Era seu vício.
Há três anos ela não tinha mais família. A mãe morreu num trágico acidente de avião, o pai não suportou a falta da amada esposa e morreu de infarto um ano após o acidente, não tinha irmãos e, coincidentemente, seus pais também eram filhos únicos. Ficou só com seus questionamentos, seu trabalho, vício e dor. Os poucos amigos que tinha faziam um grande esforço para fazê-la sorrir. Não é fácil ser amigo da Amélia, diziam eles. A amavam e por isso suporavam todos os questionamentos e a falta de risos, que é tão comum entre amigos.


