segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Urbanos II


Seus pés já estavam cansados de tanto andar. Seus braços pareciam soltar dos ombros. Chovia e ele tentava esquecer do frio que sentia. A cada cinco minutos olhava para o bebê, via se ainda respirava. Parou perto de um restaurante elegante. Havia muitas luzes por lá e isso fazia as paredes do prédio ficarem um pouco mais quentes do que era comum num dia frio como aquele. Ele se encolheu para que ninguém visse a criança que dormia tão serenamente em seus braços, tinha medo de perdê-la. A fome já corroia seu estomago e ele arquitetava um plano para conseguir alguma comida.

Do outro lado da rua havia uma mulher parada. Alta, magra, loira, com o rosto cansado. Ela esperava. E enquanto esperava, pensava. Passara a vida inteira questionando coisas, esse era seu trabalho, e mesmo quando queria parar não podia. Seu cérebro já tinha se acostumado a questionar. E quando isso acontece é como uma praga que não nos deixa relaxar. Isso nos faz realistas ao extremo, engole nossos sonhos. Seus olhos sempre percorriam as coisas em busca de uma interrogação. Uma perguntinha qualquer. Era seu vício.

Há três anos ela não tinha mais família. A mãe morreu num trágico acidente de avião, o pai não suportou a falta da amada esposa e morreu de infarto um ano após o acidente, não tinha irmãos e, coincidentemente, seus pais também eram filhos únicos. Ficou só com seus questionamentos, seu trabalho, vício e dor. Os poucos amigos que tinha faziam um grande esforço para fazê-la sorrir. Não é fácil ser amigo da Amélia, diziam eles. A amavam e por isso suporavam todos os questionamentos e a falta de risos, que é tão comum entre amigos.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Urbanos I


Então ele olhou nos olhos daquele pequeno ser. Como? Como alguém poderia ser assim tão frágil? Tentou, mas não conseguiu entender porque fora presenteado com aquele pequeno boneco de porcelana. Tão jovem. Tão frágil. Tão doce. Tão sofrido. Foi achado mas não perdido. Um bebê não é coisa que se perca como se perde uma chave ou uma moeda.

Depois de quase meia hora olhando seus movimentos desconexos, sua pele fina e seus raros cabelos na cabeça, entendeu que um dia ele foi assim. Mesmo sem suas memórias, tinha certeza do que fora.

De repente também entendeu que aquele poderia ser seu destino. Pai. Gostou da palavra, gostou de proteger alguém, gostou da possibilidade de ser amado. Abraçou-o como uma mãe a um filho recém-nascido. O bebê se aconchegou entre suas roupas sujas, mal cheirosas e úmidas. Estava decidido, aquele seria seu herdeiro.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008


Ontem fui ao CCBB.
Depois de um longo período de "seca exposicional" me deliciei com imagens e palavras de Clarice Lispector. Recomendo a experiência. Saí de lá mais impressionada do que já era com a escrita dessa mulher que não tinha esperança que suas palavras mudariam algo.
Aí vai um pouco de Clarice para vocês:

O que eu sinto eu não ajo.
O que ajo não penso.
O que penso não sinto.
Do que sei sou ignorante.
Do que sinto não ignoro.
Não me entendo e ajo como se entendesse.

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Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome.
(Perto do Coração Selvagem)

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... uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida. Foi apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, espararei quanto tempo for preciso.

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Passei a vida tentando corrigir os erros que cometi na minha ânsia de acertar.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Soneto Meu


Um dia eu estava lá
E encontrei uma criatura irritante
Então ele me disse:
Vai andar que o mundo é grande!

Eu poderia pirar,
Mas usei aquele instante
Para poder avaliar
O que era realmente importante.

Livre daquele sujeito e todos os seus defeitos
Refiz o que precisava ser refeito,
Desfiz todo o preconceito.

E com rimas muitíssimo banais
Me divirto enquanto você lê
Para um pouco de seu tempo perder





P. S.: Qual é a sensação de perder tempo lendo algo irrelevante?

P. S.1: Observe que a única regra era rimar (e de uma maneira pobre, tipo: mão com pão). Soneto escrito na tentativa de total DIVERSÃO (o q também rima com mão e pão. Dá até pra escrever outro soneto pobre desses, mas deixa pra outro dia).

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

SAUDADE, MUITA SAUDADE


Sábado estive na casa de uma amiga. Ela mora na Tijuca e no caminho para lá passei bem perto da escola onde fiz o Ensino Médio. Putz! Adolpho Bloch... isso me lembra longos papos no pátio, zoações no estacionamento, chá de coca (essa foi muito boa!), ChocoBom, tentativas de fuga, Quinta da Boa Vista, passeios pelo centro do Rio e muita muita amizade. Bons tempos! Não vão voltar.
Saudosismo não é uma das coisas que mais me definem, mas aqueles foram mais que só bons tempos. Não havia peso, responsabilidade ou dor que não tivesse cura. Eramos só sonhos.

Aos meus grandes e eternos amigos - Tabata, Joni, Alcemir e Márcio